sexta-feira, 31 de março de 2017

A falta que ama

Entre areia, sol e grama
o que se esquiva se dá,
enquanto a falta que ama
procura alguém que não há.

Está coberto de terra,
forrado de esquecimento.
Onde a vista mais se aferra,
a dália é toda cimento.

A transparência da hora
corrói ângulos obscuros:
cantiga que não implora
nem ri, patinando muros.

Já nem se escuta a poeira
que o gesto espalha no chão.
A vida conta-se inteira,
em letras de conclusão.

Por que é que revoa à toa
o pensamento, na luz?
E por que nunca se escoa
o tempo, chaga sem pus?

O inseto petrificado
na concha ardente do dia
une o tédio do passado
a uma futura energia.

No solo vira semente?
Vai tudo recomeçar?
É falta ou ele que sente
o sonho do verbo amar? 


Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 20 de março de 2017

A RODA


A roda é a mais bela descoberta humana e a única
há o sol que gira
há a terra que gira
há o seu rosto que gira sobre o eixo de seu pescoço quando você chora
mas seus minutos não se enrolarão em seu carretel para viver
o sangue polido
a arte de sofrer afiada nos troncos das árvores pelas facas do inverno
a corça embriagada por não beber
que na beirada do poço inesperadamente me apresenta o seu
rosto de escuna sem os mastros
seu rosto
como uma vila dormente no fundo de um lago
e que renasce à luz do dia, dos pastos e do ano
germina


Aimé Césaire
Tradução de André Caramuru Aubert

terça-feira, 7 de março de 2017

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